Retiro Ser Conduzido – dia 13
12 de junho de 2020

A oração dos que não têm tempo para rezar

Se dirigimos todas as coisas a Deus, tudo será oração”

(S. Inácio a S. Francisco de Borja)

De sua experiência, S. Inácio retirou uma lição. Não é o tempo consagrado à oração que é decisivo, mas a atitude do coração daquele que pretende rezar. Antes de tudo, ele coloca a liberdade ou o grau de desapego que lhe permitirá “encontrar Deus a todo momento” para cumprir a sua Vontade.

A pureza de intenção e o dom total de si às atividades são menos suspeitos aos olhos de S. Inácio do que as longas orações. Ele relativiza o aspecto do “tempo” gasto na oração, para colocar o acento sobre a disponibilidade do coração (“atitude interior”).

Para S. Inácio, a oração nunca é um fim em si mesma. Ela é um meio de união com Deus.

O essencial é ser um instrumento eficaz nas mãos do Senhor.

A oração não constitui a totalidade da vida espiritual, ela não é a única maneira de louvar e servir a Deus.

Muitas vezes S. Inácio expressa-se com vigor quando suspeita que seus companheiros são tentados a negligenciar o trabalho para se entregar à oração. Ele afirma que: “a primeira maneira de servir ao próximo, para a glória e honra de Deus é o trabalho presente e a intenção com que se toma e ordena tudo para a edificação do próximo”.

Em nome de S. Inácio, seu secretário Polanco escreve:

Eu ressalto que Inácio prefere que se experimente encontrar Deus em todas as coisas, mais que lhe consagrar muito tempo em rezar… Não se deve fazer nada, com efeito, que não seja por amor e serviço de Deus Nosso Senhor”.

Em resposta ao estudante Antônio Brandão S. Inácio escreve: “…mas pode exercitar-se em buscar a presença de Nosso Senhor em todas as ações, como é conversar com alguém, ir e vir, divertir-se, escutar, entender, enfim, tudo o que fizermos; pois verdadeiramente sua Divina Majestade está em toda parte por presença, poder e essência.

Esta maneira de meditar, achando Deus em todas as coisas, é mais fácil do que levantar-nos às realidades divinas mais abstratas, pois nossa presença diante delas exige esforço. Este excelente exercício nos dispõe para grandes visitas do Senhor, mesmo no decurso de curta oração”.

A mesma resposta é dada ao P. Godinho, que sofria sob o peso dos cuidados materiais de um colégio: “Possuir o cargo das coisas temporais pode, de certo modo, parecer como uma ocupação que distraia mas eu não duvido que a pureza de intenção que dirige tudo o que você faz para a Glória de Deus não lhe torne espiritual e muito agradável à sua infinita bondade.

As “distrações” suportadas por seu maior serviço e em conformidade com sua Divina Vontade interpretada pela obediência, não somente podem ter o mesmo valor que a união e o recolhimento da contemplação contínua, mas elas ainda podem ser mais agradáveis a Deus, porque provém de uma caridade mais ardente e forte”.

Ao P. Nicolas Berzé, que trabalhava na Índia, S. Inácio escreve:

Se o clima daí torna a oração mais difícil que aqui, haverá tanto menos razão para prolongá-la como aqui. É possível elevar seu espírito a Deus, no meio das atividades e dos estudos. No momento que se transforma tudo em serviço a Deus, tudo torna-se oração”.

A originalidade de S. Inácio vai bem mais longe, permitindo superar de uma vez a dicotomia entre uma atividade e os momentos de oração.

Para ele, a própria ação é oração, à medida que seja o “lugar” do encontro com Deus.

Convém, portanto, no próprio coração da atividade, voltar frequentemente à oração e realizar um movimento circular que vai da oração à ação, e desta à oração” (P. Nadal).

Graças a essa mútua fecundação, o próprio trabalho torna-se parte integrante da oração.

Esta convicção de S. Inácio enraiza-se certamente em sua teologia da Criação, cujo “Princípio e Fundamento” e a “Contemplação para alcançar amor” nos revelam os traços essenciais: as criaturas como lugar da “presença ativa” de Deus e mesmo como “sinal” de seu rosto.

Mais que um exercício, a “Oração na Vida” ou Oração Apostólica é, para S. Inácio, uma maneira de viver (atitude de vida).

É por uma graça privilegiada que o P. Inácio concebeu esse estilo de oração. De outra parte, ele sentia e contemplava a presença de Deus em todas as coisas. “Contemplativo na ação”, ele compreendia a dimensão espiritual de todas as suas ações e de todos os seus encontros. O que lhe fazia dizer: “é necessário encontrar Deus em todas as coisas” (P. Nadal).

Fiel intérprete do pensamento de S. Inácio, P. Nadal recomenda rezar a partir das criaturas: “É necessário considerar pacificamente nelas a ação divina, e como essa ação é verdadeiramente de Deus. É necessário tudo conduzir a Deus, todo ser e toda ação. É preciso considerar como todas as coisas estão em Deus e agem n’Ele. Nas próprias criaturas é necessário sentir a força de Deus, pela qual Ele pode se fazer compreender, contemplar, amar e adorar pela criatura.

Um coração puro, contempla Deus nos sinais e o espelha nas criaturas. Assim, tu sentirás o poder de Deus, sua presença, sua essência e mesmo sua ação”.

Tal maneira de rezar – “encontrar Deus em todas as coisas” – é um dom de Deus. Cada um recebe esse dom na medida que Deus lhe concede, e que ele coopera com toda humildade, simplicidade, pureza de coração…

Logo, tal oração não se improvisa. Ela é resultado de um longo aprendizado, que se inscreve no interior de uma vida espiritual bem conduzida.

Quem quer ser capaz de “encontrar Deus em todas as coisas” deve treinar.

É aqui que os momentos consagrados a “fazer oração” se justifica.

Esses “tempos de recolhimento” são necessários para escutar a Palavra, nutrir a fé e manter vivo o dinamismo espiritual requerido para a pureza de intenção, a liberdade e o discernimento.

Uma oração excelente: “ter sempre Deus diante dos olhos”.

Oração Contínua: consiste numa visão nova do mundo, dos homens e da história em Deus.

– A oração tem seu lugar no começo de nossa ação: como ação de graças pelo que estamos dispostos a fazer.

– A oração tem seu lugar no centro de nossa ação: como invocação para fazer o que o Senhor espera que façamos.

– A oração tem seu lugar nos limites de nossas possibilidades, como súplica dirigida às possibilidades de Deus.

– A oração tem seu lugar ao término de nossa ação: como busca de benção diante da impossibilidade de dispor do êxito ou das consequências de nossa ação.

– A oração tem seu lugar na experiência de fracasso, como busca de perdão e daquela força que provém da ação misericordiosa de Deus.

– A oração tem seu lugar na experiência de êxito, como gratidão que impede a auto-suficiência e torna possível o regozijo sem temor.

Possa o ensinamento de S. Inácio reconciliar consigo próprios tantos homens e mulheres sinceros, que sofrem e se culpam porque seus afazeres não deixam muito tempo para rezar.