Retiro Inacianidade. Dia 3
3 de agosto de 2020

3 – A experiência é a sabedoria da vida

Sabendo nós por experiência…”

(S. Inácio)

S. Inácio não é um teórico. Ele vive, observa, descreve, relata, avalia, sintetiza, devolve à ação e compromete. Os Exercícios Espirituais são destilação de experiências para provocar outras experiências.

A espiritualidade inaciana não é, em primeiro lugar, uma teoria ou um sistema, mas uma vida vivida.

Daí o caráter central, transformador e gratuito da experiência de Deus tal e como Inácio a observou e acolheu em si mesmo e como quer ajudar a que seja compreendida e recebida por outros” (I. Iglesias).

De fato, todo o processo de elaboração dos Exercícios foi produto de experimentação e não de estudo e elaboração teórica. O método dos Exercícios brota de uma observação, constatação, anotação, comparação e avaliação de sensações, desejos, ideias, moções…

Impressiona como S. Inácio acumula estratégias, caminhos, método, para levar o exercitante a viver experiencialmente a realidade, a própria realidade interna e a realidade exterior que o envolve e o transcende.

O nome mesmo de “Exercícios” está nos remetendo à experiência. Eles são uma experiência integral pois está essencialmente unida à sensação, às emoções, aos sentimentos, à imaginação, à memória, à vontade…

A experiência foi a estratégia fundamental de S. Inácio para encontrar o sentido da vida, conhecer-se a si mesmo, conhecer profundamente a Cristo, conhecer a Deus, descobrir sua Vontade e viver o serviço aos outros. S. Inácio tinha consciência de que a experiência humana é o caminho que Deus escolheu para se comunicar e chegar às pessoas. Não há Revelação à margem da experiência humana; Ela vem re-vestida de história humana. Efetivamente, “no princípio foi a experiência”. A ela S. Inácio remete-se continuamente. Ele fez a “experiência” do Deus agindo na sua história; aí O encontra e nela caminha com Ele.

Na história ele O conhece, O contempla e se une a Ele. E a história de sua vida começa a ter sentido.

Experienciar, conhecer pela experiência, fazer a experiência… mergulhar no mistério da fé, nadar no oceano de Deus: eis a questão.

A própria vida é uma grande experiência. E cada experiência pode ser uma experiência de Deus.

A vivência do amor, da comunhão, da festa, do humor, da gratuidade, da beleza, da bondade, do silêncio, da música, da arte, da poesia, da amizade, do entusiasmo, da ternura, da partilha, da admiração diante de uma paisagem, do amanhecer, de um rosto… tudo pode ser uma experiência do Mistério, à medida que abrimos o coração e contemplamos o sentido íntimo das coisas, da vida e dos encontros.

…mas pode exercitar-se em buscar a presença de Nosso Senhor em todas as ações, como é conversar com alguém, ir e vir, divertir-se, escutar, entender, enfim, tudo o que fizermos; pois verdadeiramente sua Divina Majestade está em toda parte por presença, poder e essência”. (S. Inácio).

Essa é a experiência mística da vida: “sentir Deus em todas as coisas e todas as coisas em Deus”.

O místico faz a experiência da intimidade, da presença, da proximidade, da comunhão, da aliança, da glória de Deus, em sua própria vida. Ele vive embriagado de vida, de Deus, vive como um peixe no oceano de Deus, dizendo um profundo “sim” às ondas, ao vento, ao sol, à existência…

Os místicos sentem e sabem: se Deus não pode ser encontrado no próprio coração e no coração da vida, não será encontrado em lugar nenhum.

O místico sente-se cativado, envolvido, amado, entusiasmado, sintonizado, habitado por Deus de tal maneira que seus olhos, gestos, suas atitudes, palavras, seu coração, sua existência transbordam Deus.

Nossa história pessoal é feita, muitas vezes, de fatos e acontecimentos ocos, superficiais, rotineiros, sem sentido, carregados de desencanto, pesados… tornando-se uma “história insensata”.

Vivemos uma quantidade de experiências rápidas, amontoadas, sem possibilidade de avaliação… e vamos perdendo, pouco a pouco, o sentido da história pessoal e comunitária. No entanto, essa história se faz “sensata”, se se faz a experiência do encontro com Deus nela.

Num mundo em que nem todos são capazes de grandes façanhas ou de alcançar sucessos, Deus nos deu a aptidão de encontrar a grandeza no dia-a-dia. Temos apenas de ser sábios o bastante para que possamos reconhecer o milagre no ritmo da vida.

Textos bíblicos: 1Jo 1,1-7; 2Cor 3; Sl 138; Sl 103.

Na oração: Todo cristão é testemunha de uma presença contemplada no silêncio da oração. A experiência do encontro com Deus des-vela nosso rosto e transforma nossa vida.