Retiro Inacianidade. Dia 19
19 de agosto de 2020

18 – Eleição em processo

O homem é conduzido pelo caminho que ele elege”

(paradoxo talmúdico)

Nesta sentença se encerra uma tensão: eu sou conduzido – eu elejo.

Com isto se quer significar: quando me decidi por algo a partir do profundo, em harmonia com meu ser, então são liberadas em mim, e me vem ao encontro forças semelhantes, que me abrem o caminho e me possibilitam caminhar.

Eu faço brotar, com minha própria decisão, com minha eleição, forças de meu campo vital” (Juan Bours).

Uma tal eleição, “a partir do profundo, em harmonia com meu ser”, encontra exatamente a Vontade de Deus. Onde um ser humano está profundamente em consonância consigo mesmo, está, no fundo, de acordo com Deus, e vice-versa. Deus mesmo é o mais profundo fundo de nosso ser. É o Deus “que sai ao nosso encontro de dentro para fora”.

É sempre o Senhor que toma iniciativa e faz opção por nós – mistério de amor – porque a escolha é sinal de apreço… O Senhor se “afeiçoou” a nós e quer cumprir conosco uma aliança libertadora.

Escolhidos por Deus… o Amor não tem explicações.

Escolhidos por Deus… atitude de docilidade e humildade.

Um Amor que nos envolve, nos seduz e exige a adesão total.

Entregamo-nos ao Amor e não sabemos para onde ele nos levará.

O Amor é a única força que dinamiza a missão; exige continuamente uma resposta e faz com que o sim seja sempre novo, corajoso e forte diante dos imprevistos da vida.

Cada um de nós experimenta como os fatos, acontecimentos, pessoas, vivências… nos estimulam, nos provocam, nos incitam; numa palavra, nos “chamam”; pedem de nós uma decisão, uma opção.

Ver a Cristo nosso Senhor, Rei Eterno, com o universo inteiro diante d’Ele, que chama todos e cada um em particular…” (EE. 95).

A eleição é um ato extremo de morte a si mesmo e de abertura total, radical a Deus. É o ato de fé despojada pelo qual o ser humano se entrega totalmente a seu Deus. Se se fazem verdadeiramente os Exercícios, há no texto algo que queima, que ativa o ser em tudo o que lhe é fundamental.

S. Inácio intuiu que a vida é luta e eleição e que o ser humano joga seu destino nas eleições que faz. E a vida está cheia delas. Por isso é importante eleger bem, “desejando e elegendo somente aquilo que mais nos conduz ao fim para o qual somos criados” (EE. 23).

O ser humano não nasce definido, define-se elegendo. E a eleição acontece no ritmo da vida; ali ele faz, porque elegeu; e porque elegeu, vai definindo sua vida, vai fazendo-se a si mesmo.

A eleição implica uma re-organização vital que orienta toda a atividade e evolução posterior da pessoa; trata-se da própria vocação, do orientamento pessoal, irrepetível, único, original… Significa uma qualidade de vida, ou seja, uma maneira pessoal e original de viver o seguimento de Jesus.

Na eleição há algo de definitivo, que fundamenta uma paz profunda, da qual não se deixa desalojar da mesma maneira que antes. Certamente a pessoa continuará experimentando alternâncias de “estados interiores”, mas não sacodem os fundamentos.

O temperamento, os determinismos pelos quais cada um é marcado em seu ser, seu modo de pensar, de reagir, permanecem, mas a paz profunda é a que dá consistência e unidade interior.

Na vivência dos Exercícios, a eleição alcança esta experiência de uma unidade interior nova e definitiva. Entra em ação um “processo” de unificação, a nível de si mesmo e a nível do encontro do Outro, que é Deus. Não terminou tudo pelo fato de ter feito eleição, ao contrário, abriu-se um futuro.

Toda a vida espiritual vai consistir em viver o cotidiano a nível desta adesão a Deus, resultando cada momento ocasião de um ato lúcido de abandono radical nas mãos do Criador. O “sim” de Maria é pronunciado simples e radicalmente na Anunciação. É o mesmo “sim” que disse junto à Cruz. Sua fidelidade é a mesma em todos os momentos, e no entanto, há um mundo de evolução e de progresso entre estes dois “sins”. O sim da Eleição à vida de Deus se desenvolve em cada momento, em cada ocasião.

Textos bíblicos: Lc 1,26-38; 2Cor 1,12-24; Mt 21,28-32; Ef 1,3-14; Jo 19,25-27.

Na oração: Ao tomar decisões, a iniciativa é sua ou depende de outras pessoas?

Você é uma pessoa indecisa? Em que situações a indecisão se fez mais forte?

Faça memória das decisões tomadas e que lhe trouxeram alegria, confiança…