Oração de meditação
10 de fevereiro de 2020

Oração de meditação

 

A meditação. É uma forma de oração discursiva que utiliza a memória, a inteligência e a vontade para aprofundar e assimilar um dado da fé, com vistas a torná-lo vida em nossa vida.

Inácio apresenta uma atividade sustentada pelas faculdades a partir de uma matéria proposta, cujo conteúdo deverá ser explorado, assimilado e aplicado de modo pessoal.

Ele usa o termo meditação para destacar o caráter mais discursivo do exercício, o que não impede que aconteçam “pausas”, mais ou menos prolongadas sobre um ou outro aspecto que atraia ou alimente mais.

O próprio S. Inácio prevê que esta atividade vai se simplificando, se unificando e se aprofundando à medida que se vai caminhando na oração.

 

Modo de proceder:

. Esmerar-se na introdução à oração (pôr-se em presença, fixar uma imagem interior do lugar ou do tema, pedir a graça).

. Dividir o tema da meditação em vários pontos, ou em duas ou três etapas.

. Em cada uma das etapas (sucessivamente, se necessário):

– aplicar minha memória ao tema escolhido;

– exercitar minha inteligência;

– mover meu coração, minha vontade.

. Terminar cada etapa ou tempo de oração falando ao Senhor o que aparecera na meditação.

 

  1. Aplicar minha memória: é o primeiro olhar do espírito sobre o mistério. É, portanto, um olhar orante, respeitoso. Uma simples vista das coisas, pela recordação, sua acolhida e abertura a esta história, a esta parábola, a tudo isto que Deus me apresenta e que vai usar como instrumento para se revelar.

Recordar cada uma das partes do assunto a meditar sem se preocupar com pormenores, para fornecer à oração um aprofundamento histórico.

Quê evoca em mim este ponto? A quê aspecto de minha história este ponto faz alusão?

Deixar que aflorem as imagens. Deixar que ressoe todo o alcance da história, trazer à memória os fatos, a realidade que conheço, recordando o que a Escritura diz sobre isso, ou o que conheço pela minha própria história (afetiva, corporal), em todo ser humano, na Igreja…

 

  1. Exercitar minha inteligência: esta se ocupa em detalhar o que a memória percorreu. Ela o fará de maneira orante, não como fria reflexão.

Quê é que entendo? Quê consequências se derivam deste ponto?

Refletir…Quando a memória evoca minha história e a realidade, a inteligência se põe a trabalhar para compreender melhor as ressonâncias, as implicações, as dimensões do mistério.

Recorrer à capacidade de comparar, de raciocinar, de assinalar as contradições ou as questões que este ponto estabelece em minha vida…

Assimilar, tornar pessoais os pensamentos lidos (quem? o quê? para quê? porquê? como?) de modo que o espírito fique convencido.

Confrontar a verdade meditada com a nossa conduta e desse confronto, tirar a base das resoluções.

 

  1. Mover meu coração, minha vontade: deixando-me afetar, implicar. À raiz desta meditação que deveria fazer ou dizer ao Senhor?

Influenciada pela inteligência que a penetra, iluminando-a com compreensões íntimas do mistério, a vontade desabrocha em amor, intimidade, plenitude do coração.

Revolver minha memória, sacudir minha inteligência em relação a este ponto e agora chega o momento de “tocar o coração”. Não se trata de fazer malabarismos com um artigo de fé, senão de seguir o Senhor mais de perto, sem tirar da fé suas dimensões interiores que são a memória e a inteligência. Já que o coração não se deixa levar por emoções sensíveis, a vontade entrará em jogo.

No coração se concentra tudo o que sou, em minha capacidade para decidir-me por Deus.

 

Movido pelo que recordei e compreendi, re-oriento-me, comprometo minha liberdade, por fidelidade ao Amor.

Isto é possível:

“espontaneamente”: da meditação brota amor, agradecimento ou outros sentimentos e o digo ao Senhor de coração a coração;

– ou pela vontade: (desejos de desejos) de uma conversação mais radical, de uma decisão sobre um ponto concreto, ou de renovar minha fidelidade, ainda que não o sinta. Esta forma mais “voluntária” de seguir o Senhor mais de perto é tão verdadeira e proveitosa quanto a primeira.

 

Deixar que os afetos, provocados pelo exercício da memória e da inteligência se expandam.

Esta expansão é que constitui a oração.

– Neste momento a inteligência deve parar, suspender sua atividade porque atingiu o seu fim.

– Este movimento dos afetos pode acontecer durante toda a meditação, embora tenha este espaço onde deve ganhar em profundidade e extensão.

– Enquanto a vontade encontra alimento em um sentimento, ficar aí até que se sinta satisfeita.

– A inteligência só deve voltar a funcionar quando os atos da vontade começarem a se extinguir.

 

A etapa da vontade junta o coração à razão, a dimensão afetiva à dimensão racional. É esta etapa da vontade que dá sentido às duas etapas anteriores. Já na “aplicação da memória” e no “exercício” do entendimento, a pessoa deve ter presente que é na afetividade que esse “trabalho” deve desembocar.

É esta afetividade que dá à meditação o caráter de “exercício” segundo a concepção de S. Inácio: um esforço espiritual que tem consequências de vida.

Do saber ao sabor, do sabor ao sentir, do sentir ao decidir.

É a linha profunda da meditação inaciana.

 

No exercício das faculdades cabe à vontade e seus afetos o lugar mais importante.

É ela que orienta a oração para o fruto que se quer alcançar.

Conseguindo isto, S. Inácio recomenda uma grande liberdade. Ele mesmo, se recusa a direcionar.

O Espírito Santo que assume a oração é quem lhe vai dar o rumo, cabendo ao exercitante, entregar-se à sua ação, aberto e dócil às suas “moções”.

“No ponto da meditação em que achar o que quero, ali me repousarei, sem ter ânsia de passar adiante, até que me satisfaça”. (EE. 76).

 

Atenção!!!

Não se pode cortar em fatias a “memória, inteligência, coração, vontade”.

Falando das três potências em separado, S. Inácio não pretende estabelecer uma divisão interior na pessoa; trata-se, simplesmente, de uma divisão prática.

Logo, a meditação não deve ser concebida de maneira rígida, compartimentada, mecânica: 1º aplicação da memória; 2º aplicação da inteligência; 3º aplicação da vontade; colóquio e resolução.

Caso esta “compartimentação” aconteça, ela não é inaciana.

Cada um procure que sua meditação não fique em meras recordações (no passado) ou somente na cabeça, como tampouco em mera afetividade.

O mistério e a ação de Deus afetam nosso ser em sua totalidade.

Diante da Palavra de Deus, recebida, saboreada, quem responde e se compromete numa palavra ao Senhor (colóquio) sou “eu”, em minha unidade.