1 – A arte da “conversação”. I
“Não saia de vossos lábios nenhuma palavra inconveniente,
mas na hora oportuna, a que for boa para edificação,
que comunique graça aos que a ouvirem”
(Ef 4,29).
Não era S. Inácio condutor de massas ou multidões, mas de pessoas, ou de pequenos grupos seletos. Ele conhecia por intuição a psicologia humana e tinha o dom de “trabalhar” as pessoas.
Ao dom de cativar as pessoas somava-se o fato d’ele ser admirável na arte da conversação, que era “grave, não rápida, nem precipitada, nem vazia ou superficial, mas sólida e eficaz, e própria de um homem santo” (MI, Scripta I, 513).
Desde os primórdios de sua conversão, um desejo constante habita o coração de Inácio: compartilhar com outros a experiência que ele viveu. Ele não é um intelectual; não convence pela profundidade de suas especulações, nem pelo brilho de sua dialética, nem pelos recursos de sua retórica.
Já nas “conversas espirituais” inauguradas em Loyola, Inácio convence, comove e atrai pela firmeza e profundidade de suas convicções, pela autenticidade de suas palavras e de sua conduta, pela irradiação enfim de sua vida espiritual.
Ele tinha um trato especial com todos e cada um em particular; ele era o companheiro-guia que exercia um suave magistério e liderança, firme e seguro. Chama-nos a atenção como Inácio respeita e protege a liberdade da pessoa. Ele não impõe a sua experiência pessoal.
Há um segredo em sua capacidade de convencer e mover as pessoas: a identificação com Jesus Cristo em suas atitudes, opções, valores…
Com sua presença Inácio fermenta o ambiente e transforma as pessoas.
A arte de Inácio para ganhar corações era ter verdadeiro e sincero amor àqueles a quem ajudava, mostrar com palavras e obras… despertar a confiança das pessoas… adaptar-se às suas condições e condescender naquilo que não seja contra Deus… estimulá-las e ajudá-las a atingirem o máximo de suas possibilidades…
“Sempre inclinado para o amor”, apaixonado por Deus e pela atuação d’Ele no coração das pessoas, Inácio sonha em fazer os outros participarem plenamente deste amor pelo qual se deixou invadir por inteiro, aceitando caminhar longamente com cada um, para que, no final, abrisse o coração à “irrupção” de Deus e afinasse o interior até tornar-se sensível aos apelos d’Ele.
Em Paris, “começou mais intensamente do que costumava, a entregar-se às conversações espirituais” (Aut. 77), sobretudo entre os estudantes espanhóis e portugueses, pela facilidade da língua.
Inácio se encontra no centro de um vasto leque de contatos com muitos jovens; trabalhando como escultor, com fé e perseverança, ele não tardou em descobrir jovens estudantes de viva inteligência, corações generosos, têmpera de heróis, vontade decidida, movidos por um ideal.
Segundo Pe. Nadal, Inácio foi um homem hábil nesse ministério da conversação espiritual: “Primeiro, o colóquio espiritual privado, no qual se encontra um exímio recurso e apoio para ajudar o próximo. Deste meio, acostumava o Padre Inácio dizer coisas excelentes e outras admiráveis; ainda que seja muito útil aquilo que fazem os pregadores e leitores na cátedra frente a uma multidão, Inácio procura fazê-lo em particular, com cada um. Porque certamente existe nisto maior liberdade, maior força para adaptar suas palavras à variedade de respostas e de disposições…” (Exhorta. 6ª, no. 59).
Através da conversação Inácio exorta, anima, comunica, corrige, consola… busca o bem mais universal. Com todos ele entabulava primeiro uma “exterior conversação” e logo, uma vez preparados, também a “interior”, sabendo entrar e conduzir cada um com magistral destreza e delicadeza, “segundo as pessoas e as situações”. “Quando converso com alguém para comunicar coisas de Deus, embora seja eu muito pecador, sou eu o que ganho e encontro proveito” (S. Inácio, carta 12-fev-1536).
Texto bíblico: 1Cor 9,15-23.
A arte da conversação é um caminho pedagógico, um processo gradual que requer de nós uma capacidade de escuta, de acolher e deixar-se tocar pelo que o outro é, não só pelo que diz; uma capacidade de olhar com profundidade para reconhecer uma história santa, um caminho de salvação. É reconhecer no outro o que há de verdadeiro, bom, formoso, e descobrir como o dinamismo de Deus atua no coração dele. É ajudá-lo a descobrir, na trama de sua vida, as motivações profundas que o levam a ser e a agir de uma maneira muito pessoal.