7 – Ser companheiro de Jesus
“Não somos meramente companheiros de trabalho; somos “amigos no Senhor”
Desde os primórdios de sua conversão, um desejo habita o coração de Inácio: compartilhar com os outros o que ele experienciou. Ele convence, comove e converte pela firmeza e profundidade de suas convicções, pela autenticidade de suas palavras e de sua conduta, pela irradiação de sua vida espiritual.
Ele “seduz”, ganha a simpatia, a amizade, a admiração das pessoas pela comunicação apaixonada e serena de sua experiência de Deus.
Há um segredo em sua capacidade de contagiar as pessoas: a identificação com Jesus Cristo.
Em sua viagem à Terra Santa, Inácio ficou muito marcado com a imagem do Cristo companheiro, que o chama a trabalhar com Ele. Em cada canto daquela terra ela “via” Jesus ocupado em estabelecer o Reino do Pai. E não estava só, mas com o grupo dos apóstolos, companheiros de Jesus e companheiros entre si.
Ordinariamente, a palavra “companhia” foi identificada com algo guerreiro ou de armas (é uma interpretação tardia em castelhano e não pretendida por Inácio); no entanto, etimologicamente, “companheiro” – “companhia” tem a ver com o fato de “compartilhar o mesmo pão”.
Companheiro é quem come o pão com outro.
Por isso, Inácio-leigo busca amigos e compartilha com eles o dinheiro e a comida nas universidades que estudou, dando-lhes os Exercícios e convidando-os à solidariedade com os mais necessitados…
Daí também se entende porque Inácio sai sempre em busca de companheiros com os quais podia compartilhar todas as suas experiências. Neste sentido, é interessante considerar como a amizade – como expressão e extensão da relação com Jesus – não levou o leigo Inácio a tratar somente com os homens.
Sua amizade com várias mulheres foi sempre muito forte, muito rica e duradoura.
A personalidade de Inácio, sua sensibilidade e capacidade para o acompanhamento espiritual, foram influenciadas, seguramente, por sua amizade ampla e próxima com as mulheres.
Este contexto de “compartilhar o pão” aparece também no exercício do Reino: “portanto, quem quiser vir comigo há de contentar-se de comer como eu, bem como de beber e vestir, etc… do mesmo modo há de trabalhar comigo” (EE. 93).
A partir disso, começa a se modelar o inaciano como “companheiro” de Jesus.
O chamado de Jesus feito aos apóstolos e o posterior envio deles para a missão, são duas páginas do Evangelho que marcaram profundamente Inácio e que se encontram refletidas nas meditações mais tipicamente inacianas: o chamado do Reino, as Duas bandeiras, os Três binários.
S. Inácio tem consciência de que não é ele que chama os outros a se unirem à sua missão.
É o Rei Eterno que chama todos pessoalmente e os torna “companheiros” d’Ele para o trabalho de construção do Reino do Pai. É o Senhor que conversa com seus colaboradores e amigos e os envia em missão.
Para quem é inaciano, Jesus é central porque assim o experimentou nos Exercícios. Não só o conhece senão que chegou – por graça – a sentir como Jesus, para atuar como Ele, sendo impulsionado a encarnar-se com a sensibilidade d’Ele. Por isto, o centro da vida é o Senhor a quem se experimenta como amigo e companheiro, porque no colóquio da oração aprendeu a falar com o Senhor “como um amigo fala a outro amigo” (EE. 54).
Toda a experiência da Segunda semana está perpassada por este seguir a Jesus até às últimas conseqüências e de colocar-se em sua companhia; é o “comigo” que brota do exercício do Reino.
A experiência de ser pecador perdoado lhe dá um matiz específico a este traço: é pecador, e no entanto, é chamado a ser companheiro… O mais profundo disto é que, precisamente por ser pecador perdoado, é chamado a “compartilhar o pão”.
Esta é a nova compreensão do que é ser pessoa inaciana: pecador perdoado, chamado a ser companheiro de Jesus.
Textos bíblicos: Lc 24,13-34; At 2, 42-47; Jo 21,1-18; Col 3,12-17; 1Cor 11,23-34.
Nos Exercícios, a pessoa inaciana aprende a descobrir a Jesus em sua Palavra, na Eucaristia e também nos necessitados: “como padece Cristo na humanidade” (EE. 195).
Esta experiência faz com que o inaciano fomente a companhia da pessoa de Jesus, mas também gerando companhia com os outros. A espiritualidade laical inaciana possui, como algo essencial, o traço do companheirismo: do compartir o pão ao tornar-se alimento para os outros