7 – Serviço: passagem do “fazer” ao “ajudar”
Estamos mergulhados numa cultura de resultados, distraídos e perdidos na variedade de luzes, cores, sensações fugazes, vivências superficiais… A existência inteira faz-se maquinal e rotineira.
O cotidiano torna-se convencional e, não raro, carregado de desencanto, pesado, estressante… Corremos o risco de sermos apenas imitadores ou repetidores, pois tememos nos perder na busca do novo; as respostas são confirmadas e as perguntas silenciadas.
Vivemos a “compulsão da utilidade”, preocupando-nos unicamente com o “fazer habitual” que não tem maior impacto realidade social-eclesial, não muda nada…
De fato, muitas vezes vivemos, no cotidiano da vida, o drama da desintegração: atividades soltas, des-providas de inspiração e criatividade, num ritmo burocrático e sem o exercício da avaliação das mesmas. Falta uma referência e um horizonte que unifique tudo, que possibilite reorientar e canalizar nossas potencialidades, impulsos, inspirações, que desperte nossa paixão e dê novo sentido à nossa missão.
Como cristãos, fazemos as coisas que fazemos, poucas ou muitas, talvez demasiadas; umas, gostamos mais, outras, menos; umas são escolhidas, outras impostas; umas as elegemos, outras não temos outro remédio a não ser fazê-las. Com isso, nossa missão se transforma em puro ativismo, ou seja, fazer por fazer, fazer para afirmar-se, fazer para brilhar, fazer para produzir, fazer para impor…
Para ajudar a integrar bem os diversos dinamismos da vida, é decisivo centrar no horizonte que inspira nossa missão e nos motiva a fazer o que fazemos e como fazemos.
É aqui que se situa a chave de integração de nossa vida: o horizonte é “ajudar”.
“Ajudar”, como atitude pessoal e comunitária, é o equivalente à expressão evangélica “servir”. Um “ajudar” (servir) que brota da experiência de ser “ajudado” (servido) por um Deus Servidor.
No “ajudar” dão-se as mãos o amor a Deus e o amor à pessoa humana, a experiência interior e a ação cotidiana, a ação e a contemplação; nele se expressa a profundidade e o enraizamento da pessoa nas exigências cotidianas da vida; nele convergem a busca de Deus e o compromisso com o mundo.
“Ajudar” nos remete a uma espiritualidade ativa, mas que não consiste meramente em “fazer”, nem se acomoda com qualquer forma de fazer; ele nos permite olhar o global e comprometer-nos com o particular. “Ajudar” pede um coração magnânimo, ou seja, grandeza de sonhos, de ânimo e de desejo; mas, ao mesmo tempo ele nos convida à humildade, ou seja, abrir-nos às necessidades do outro, descer ao nível do outro, renunciando nossos próprios critérios, modos fechados de viver…
“Ajudar” é oposto do ativismo, que é um fazer “insensato”, sem sentido e sem direção. “Ajudar” é fazer com inspiração, com horizonte de sentido; é perguntar-nos continuamente: “por que fazemos isso? para quem fazemos? por que fazemos dessa maneira?… “Ajudar” nos permite “trabalhar descansadamente”, encontrando prazer e humor naquilo que fazemos, porque iluminado por um horizonte que nos atrai.
Para “ajudar” de verdade, é necessário em primeiro lugar, que nosso fazer esteja atravessado de visão (de Deus, de ser humano de mundo), de escuta, de atenção, de compaixão e contemplação da realidade na qual estamos inseridos, e das pessoas a quem somos chamados a ser presença solidária; que não seja, simplesmente, a aplicação de um plano ou esquema pré-estabelecido, pensado a partir de nós mesmos.
“Ajudar” não vai na linha do impor, senão do propor. Trata-se, isso sim, de propor com qualidade, com firmeza, com proximidade, com compromisso pessoal, tendo cuidado especial na arte do acompanhamento. Isso requer presença gratuita, desinteressada, centrada no bem da outra pessoa, sem criar dependências, mas fazendo o outro crescer em liberdade.
“Ajudar” implica possibilitar ao outro ser protagonista de seu processo, devolver ao outro a autoria, a autonomia… No “fazer” o centro somos nós, no “ajudar” é o outro; no “fazer” medimos a quantidade, no “ajudar”, a qualidade de nossa ação. No “ajudar” há parceria (mão dupla): na medida em que ajudamos, somos ajudados; na ajuda há um enriquecimento e crescimento mútuo.
“Ajudar” não é substituir os outros naquilo que eles podem e tem de fazer, ou dizendo o que tem de ser feito, mas colocá-los em condição de que eles mesmos se experimentem ajudados, descubram por isso o Deus que ajuda a todos e sintam o impulso para ajudar a todos como ideal de suas vidas.
Essa permanente de atenção, vigilância, escuta… pede de nós uma atitude interna de exame, de busca, de pergunta, de discernimento: “o que é o melhor para o outro? O quê lhe ajuda mais?
Tal discernimento ajuda a nos descentrar para “ajudar” com a marca evangélica, ou seja, nos anima a seguir Jesus pobre e humilde, sob a força do seu Espírito, no compromisso com a vida.
A prioridade da atenção aos outros nos obriga a pensar, a inovar, a propor de uma outra forma, a mudar… Só assim, quando nosso fazer é dinâmico, ele se transforma em “ajudar”. O carinho e a sensibilidade para com os outros, o desejo profundo e sincero de “ajudar” é o que vai nos mobilizar.
Se a lógica profunda do nosso fazer é “ajudar, devemos fazer mais por aqueles que mais ajuda necessitam, por aqueles mais desvalidos, que são mais fracos, que estão mais desprotegidos…
Além disso, “ajudar” tem maior visibilidade quando a missão é vivida em grupo, quando a colaboração com outros e a partilha em comum tornam-se um “modo de proceder”, esvaziando-nos de toda pretensão de sermos proprietários para sermos simples servidores.
O seguimento é relacional: o “co-ajudar” com Jesus é inseparável do “co-ajudar” com tantas pessoas, constituindo assim o grande corpo apostólico de colaboradores. Assim vivido, o “ajudar colaborativo” nos faz “amigos no Senhor” e se converte em espaço de companheirismo e em oportunidade única de encontro e comunhão com outras pessoas, movidas pelo mesmo espírito.
“Ajudar” os outros, inspirados e animados pelo Espírito de Jesus, é o que torna “espiritual” nossos atos, nossos pensamentos e orações, nossos trabalhos, nossa vida inteira.
“Ajudar” faz “espiritual” nossa vida, toda nossa vida.
Textos bíblicos: Lc 10,38-42; Col 3,12-17; Mt 5,1-12
Na oração: sua missão como seguidor de Cristo: simples ativismo burocrático ou espaço de ajuda criativa?