25 – Silêncio: paciente espera do Espírito
“Fica em silêncio e escuta, ó Israel: hoje vieste a ser o povo de Javé, teu Deus.
Portanto, escutarás a voz de Javé, e porás em prática seus mandamentos”
(Dt 27,9)
Se o Deus bíblico “fala” a seu povo, compreendemos que a “escuta” seja a característica da tradição judaico-cristã.
Mas, para o homem bíblico, a “Palavra de Deus” não cai do céu, mas “nasce” na encruzilhada dos acontecimentos e de homens e mulheres que a vivem. No cruzamento de um evento histórico, vivido pelo povo com o “coração”, alguns homens, inspirados pelo Espírito de Deus, interpretam este evento.
Ao longo da história, Deus suscita “mediadores” que no silêncio do deserto ou de seu “coração”, ouvem o Espírito, refletem e interpretam a significação profunda da história de seu povo e nela discernem uma Presença atuante, a de Deus.
Estes eventos tornam-se, então, “palavras” de Deus, mensagens compreensíveis a serem transmitidas a todo o povo.
Existe em S. João, um elo muito estreito entre “escutar a Palavra” e “crer” (Jo 5,24).
Ora, este “escutar e crer” requer certas disposições interiores essenciais: o acolhimento e a reflexão, no silêncio de nosso interior.
Esta escuta é fruto do “silêncio que escuta”, silêncio que já é ação de Deus que inclina o coração do homem a abrir-se à Sua revelação (Jo 6,44-45).
A Palavra de Deus só pode tocar o coração daquele que está disponível, em estado de “escuta”. Somente quem é “pesquisador” de Deus, enamorado do silêncio, que vive à “escuta de Deus”, pode ouvi-lo.
Na Bíblia, a experiência do deserto, com sua forte conotação de solidão e silêncio, ocupa lugar significativo. Este tempo de solidão inscreve-se no itinerário pascal de todas as vidas. Tempo em que cada um de nós, eterno filho pródigo, lembra-se de que sua vida é um êxodo rumo à Terra Prometida, imenso retorno à casa do Pai.
Solidão que nos faz recordar que converter-se é, cada manhã, sair de si mesmo, descentralizar-se, mudar a direção para caminhar rumo ao Pai, rumo a nossos irmãos.
Solidão durante a qual cada um de nós é convidado a reviver as escolhas fundamentais do povo hebreu e do Cristo no deserto.
Na tradição cristã, os padres do deserto e os grandes espirituais consagraram longos capítulos de louvor ao silêncio, muitas vezes considerado como o “húmus” das virtudes teologais (fé, esperança e caridade), da vida no Espírito, da santidade.
Referindo-se à própria experiência, fazem do silêncio o mestre incomparável que desenvolve a atenção a Deus, aos outros, e predispõe, assim à adoração e ao serviço das pessoas.
Como a seiva sobe e irriga a árvore em silêncio, o Espírito criador toca o “coração” de suas criaturas com imperceptíveis inspirações que somente a pessoa de silêncio consegue captar.
Quantos já penetraram neste silêncio do “coração”, nesta sutileza de seu ser onde pressentiram outra dimensão de si mesmos e do mundo!
Rom 8,26-27:
. Fazer silêncio é um modo de preparar nosso “coração” para acolher o Desejo do Espírito em nós. A oração lança suas raízes na iniciativa de um Deus-Amor que deseja cumular-nos de sua Presença.
. Como ousar penetrar no silêncio, perseverar na oração, se não estamos convencidos de sermos “habitados” pelo Espírito que é “Desejo-de-Deus em nós”?
. E como poderíamos ouvir murmurar a fonte interior do Espírito em nosso “coração”, sem fazer silêncio, que é também um dom de Deus?
. O “silêncio do coração” é manifestação, em nós, do Espírito que respira Deus, aspira por Deus, adora e intercede (Gl 4,6). Não “fazemos” silêncio, nele entramos, abrimo-nos a uma Presença que torna inúteis as palavras. Este silêncio espiritual, o ser humano não o dá a si mesmo, mas acolhe-o.
Na oração: Mergulhar no silêncio como num banho que regenera.
Deus está presente em toda parte, tanto nas cidades quanto no deserto, mas é no “silêncio do coração” que aprendemos a discernir esta Presença, a ouvir seus passos na brisa suave de cada um de nossos dias.