1 – Exercícios Espirituais:
no “deserto” se esconde e se revela uma presença
(Peregrinação interior para um maior serviço)
O pano de fundo deste exercício é a experiência bíblica do deserto como passagem constante da escravidão à liberdade, do lugar estreito no Egito à amplidão da Terra Prometida. O deserto é a experiência pela qual Javé faz passar Israel para que este se tornasse Povo de Deus, antes de entrar na Terra Nova. Deserto passa a ser tempo de purificação e de vida em marcha: povo peregrino apegado somente em Deus.
No deserto Israel aprendeu a descobrir e a confiar em Javé. Longe da segurança do Egito emerge o que há no fundo do seu coração. Os profetas cantam o tempo do deserto como tempo das obras maravilhosas de Deus. Foi no deserto que o povo de Israel sentiu profundamente sua pequenez e total dependência de Deus.
Na travessia do deserto aconteceu a provação e a intimidade com Javé.
Não existiam caminhos prontos. Era preciso discutir, planejar, rezar, lutar e sonhar para fortalecer a caminhada. No fundo, o Êxodo era uma radical opção pela liberdade, porque um povo só é livre quando pode escolher o rumo de seu caminhar:
Deserto: lugar da Aliança, escola da intimidade com Deus; expressão que, mais do que um determinado lugar, indica uma experiência forte de Deus.
Jesus, como todos os profetas, antes de entrar em missão é conduzido pelo Espírito ao deserto. Ele recorria a esta experiência em meio à sua vida ativa: afastava-se para lugares solitários, confrontava a sua missão com a Vontade do Pai.
Todos os personagens bíblicos, todos os santos passaram pela experiência de deserto: peregrinação interior, confronto com a própria vida, comunhão com o Senhor, descoberta da própria missão… Nós também somos chamados ao deserto: “Eu o levarei ao deserto e falar-lhe-ei ao coração” (Os 2,16).
Ao tomar distância do viver cotidiano, temos a possibilidade de reconhecer a ação de Deus em nós com outra luz e com outra força. A experiência de deserto passa a ser “tempo e lugar” de decisão, de orientação decisiva da vida, de enraizamento de nossos valores, de consciência maior da nossa identidade pessoal e da nossa missão… O mestre do deserto é o silêncio; o deserto tem valor porque revela o silêncio, e o silêncio tem valor porque nos revela Deus e a nós mesmos.
O deserto é o grande auditório para ouvir Deus; “solidão” cheia de presença. Ainda que sozinhos, sentimo-nos solidários, em comunhão com todos. A proximidade de Deus vai ser sentida e percebida.
“O deserto é fértil” (D. Helder)
Com sua austeridade e simplicidade, o deserto não é lugar de experiências superficiais.
A profundidade da identidade de uma pessoa é testada e experimentada no deserto.
Quem anda no deserto sente profundamente o que é o “nada”; o deserto grita o nosso “nada”, nos coloca entre a areia e o céu, o nada e o Tudo, o eu e Deus.
A prática do “deserto” é um fator sempre presente em toda procura séria de Deus.
Portanto: o deserto é o lugar do encontro:
. encontro consigo no despojamento, onde a pessoa reconhece sua radical pobreza;
. encontro com os outros pela capacidade que se adquire de uma comunicação que brota de dentro;
. encontro com Deus que se faz sentir em cada etapa do caminho, como o grande Peregrino.
Nesse sentido, nosso Retiro torna-se um “estar com Jesus” no deserto, para, como Ele, dar a Deus o lugar central de nossa vida. Os Exercícios Espirituais são um tempo no qual damos maior liberdade a Deus para agir em nós; é abrir espaço, alargar o coração para a ação de Deus. É tempo de re-construção de si (conversão), de retomada da opção fundamental por Deus e pelo seu Reino (maior serviço, mais compaixão, mais partilha, mais solidariedade…).
Textos bíblicos: Deut 8; Ex 3,1-15; Ex 13,17-22; Is 55; Sl 23(22); 27(26)
Na oração:
– qual é o seu estado de ânimo e disposição para viver esta experiência do Retiro?
– Você está preparado para a travessia do deserto? Está disposto a “caminhar”, a “sair”?
– Você está disposto a ser mais servidor, mais acolhedor, mais atento aos outros… após esta experiência?