24 – S. Inácio:
experiência de encontro com o Deus caminhante
“Conhece-se a Deus pelos pés”
(Carlos Mesters)
“No princípio foi a experiência”. A ela S. Inácio remete-se continuamente.
A experiência humana é o caminho que Deus escolheu para se comunicar e chegar às pessoas.
S. Inácio fez a “experiência” do Deus agindo na história; aí O encontra e caminha nela com Ele. Fez-se peregrino com o Deus peregrino.
“Deus o conduzia pela mão como um mestre conduz seu discípulo” (Aut.).
S. Inácio faz a experiência da intimidade, da presença, da comunhão, da glória de Deus em sua própria vida. Ao sentir-se cativado, envolvido, amado, sintonizado, habitado por Deus, ele nos revela “traços” característicos do rosto do mesmo Deus.
Quem é Deus para S. Inácio?
Deus é o Criador e Senhor, que envolve a criação com seu Amor dinâmico e criativo.
O Deus Criador é Comunidade de Amor: Deus é Trindade salvífica.
A mística de S. Inácio é uma “mística trinitária”. É na Trindade onde ele busca o ponto inicial e final de seu discernimento, numa atitude de acatamento e reverência. O traço característico de S. Inácio não é o “repouso que se abandona” à contemplação da Trindade em si mesma, em suas relações eternas. Ele passa a contemplar a Trindade dinâmica, agindo na história dos homens.
S. Inácio passa da contemplação da Trindade à contemplação das obras da Trindade, ou mais exatamente, uma contemplação de todas as coisas a partir da Trindade.
O Deus que se comunica a S. Inácio é o Pai de quem Cristo fala: “Meu Pai trabalha sempre e eu também trabalho” (Jo 5,17). É um Deus ativo, operante, fonte de vida, que realiza obras admiráveis e santas. Deus, em seu amor gratuito, vem ao encontro do ser humano e o introduz no movimento de sua própria Vida. Somos seres agraciados. Viemos de Deus e voltamos para Deus. “N’Ele vivemos, nos movemos e existimos”.
Esta inspiração está fortemente presente na “Contemplação para alcançar amor” (EE. 230-237), onde se expressa aquilo que é o núcleo da espiritualidade inaciana.
Aqui o exercitante encontra-se como que no centro do mistério único, que é ao mesmo tempo o mistério do Deus Criador e do Deus Redentor, do Deus que “dá a Vida” e que conserva o universo, do Deus de quem tudo procede e para quem tudo retorna; em síntese, trata-se do mistério do Amor de Deus.
A partir de Deus tudo é dom; tudo foi criado e “dado de graça” para todos. Tudo é graça. Deus é um “esbanjador” de dons e bondade. Tudo tem sentido e valor. Mas Deus não só nos concede dons; Ele faz-se presente nos seus dons. Presença amorosa. Deus vem misturado com a realidade. Deus habita nas criaturas, no ser humano… fazendo de cada um de nós seu Templo.
Deus é o princípio vital, enquanto sopro que anima e dá o “ser”, “crescimento”… Deus não permanece exterior à sua Criação, mas habita no meio dela. As “criaturas” são o que são devido a presença de Deus nelas. Tudo está inundado de Deus; tudo é sagrado, nada é profano. Deus santifica tudo.
A presença de Deus é ativa: Deus trabalha em todas as coisas e em cada um de nós. Tudo está sendo construído e reconstruído por Deus. Ele continua re-criando e fazendo tudo novo. Ele é a força inesgotável que conduz tudo para a plenitude. Finalmente, Deus como fonte da qual procede todo bem. Deus se deixa “transparecer” na Criação; Ele deixa traços e pegadas de sua santidade nas criaturas. Em todas as coisas aparece a sabedoria, a beleza, o dom de Deus. Através da Criação podemos conhecer algo do que é Deus.
Para S. Inácio, a devoção consiste na atitude de “encontrar a Deus em tudo”, para amá-lo e servi-lo: é a familiaridade com Deus em todas as ações da existência.
Os Exercícios Espirituais não ensinam chegadas, só partidas.
Esse é o desafio: “entrar” no caminho de Deus é viver em terra de andanças. O caminho se converte em caminho para um encontro mútuo, um encontro de dois peregrinos: Deus e o ser humano.
Texto bíblico: Is 35.
– Orar é entrar na Tenda do Senhor, que é o próprio coração: peregrinação interior, mobilidade…
– Deus “passa” e nos coloca em movimento; a oração é “fazer estrada com Deus”, caminhar na mesma direção, entrar no ritmo de Deus, deixando-se “ser conduzido”.
– Para onde sinto que Deus vai me conduzindo? Há alguma coisa que me aprisiona?