8 – Do ruído nocivo ao silêncio de Deus
“A grandeza do ser humano é poder se interiorizar”
(L. Boff)
Movemo-nos em ambientes de barulho e de massificação onde nossa identidade humana e cristã tende a se dissolver. O ser humano normal, sadiamente religioso, precisa de períodos em que possa ficar consigo mesmo, diante de Deus.
Temos de voltar ao essencial, ao ser profundo, àquilo que nos escapa pela agitação do trabalho, da luta…
Que conteúdos damos ao silêncio?
Ele está vazio se reflete apenas nossa superficialidade; ele pode encher-se de tesouros de sabedoria se arriscarmos descer no fundo das coisas e de nós mesmos.
O silêncio está relacionado com toda a criatividade humana, que, vindo de “profundidades silenciosas do nosso ser”, esbarra com o muro da agitação barulhenta.
O ruído enfraquece as energias vitais, como faz a doença;
O silêncio as concentra, como faz a cura.
“Contudo, amamos o deserto, porque o deserto era aquilo que nascia em nós, aquilo que aprendíamos sobre nós mesmos” (Saint-Exupéry).
O silêncio, o deserto… nos assustam, porque representam um absoluto misterioso e desafiador.
O deserto, que aparentemente é todo superfície, convida à profundidade, na qual pode jorrar a água do poço escondido.
Existe, com efeito, em Deus, uma pedagogia constante. Ele começa sempre por enviar “ao deserto” aqueles aos quais quer confiar uma difícil missão de serviço a seu povo: Moisés, no deserto de Madiã; João Batista, no deserto da Judéia; S. Paulo, no deserto da Síria; S. Bento, nas solidões de Subiaco; S. Francisco, nas grutas de Assis; S. Inácio, na gruta de Manresa…
Tempo da verdade, momento em que o homem assume sua pobreza e abre-se aos dons de Deus.
Tempo de aprofundamento da fé.
Tempo de rupturas necessárias para acolher uma liberdade nova e preparar-se para viver uma nova comunhão com todos os homens.
Todas as grandes testemunhas que marcaram a História da Salvação permanecerão grandes apaixonados do silêncio. Aquele que não possui o gosto do silêncio corre grande risco de tornar-se um funcionário que administra o sagrado, mas não um colaborador de Deus.
“A palavra é o traço de união entre dois silêncios. O silêncio das coisas e o silêncio de Deus… Antes e depois da palavra, está o silêncio. Pois o místico tende ao silêncio… Entre as coisas de Deus, está a palavra, como testemunho, comunhão e profecia” (Carlos Villaça).
O silêncio é um direito da pessoa. Onde ir em busca dele?
“Quanto mais o silêncio se inscreve na alma, tanto mais ele é a expressão do mistério do ser. Seu segredo e sua epifania tornam-se, então, oração. Oração sem palavras. O silêncio não é apenas uma condição da meditação, é semente de contemplação. Algo da serenidade expande-se como uma onda em nossas profundidades. O silêncio é outra linguagem. Outra música. Vem de longe nos momentos de fé dolorosa e, também, nos momentos de fé satisfeita” (Pierre Talec).
“Para quem crê, o silêncio está habitado”
“O silêncio é a grande revelação” (Lao-Tsé)
“Calamos não porque não temos o que dizer, mas porque não sabemos como dizer tudo que gostaríamos de dizer” (Sor Joana)
“Buscar sempre as respostas no fundo de si mesmo, no numinoso sacra sacrorum do mais íntimo. Não que a vida e seus acasos mereçam desprezo, mas sim alguma distância… A voz mais profunda da interioridade tem origem divina” (Dora Ferreira)
“A oração é o suspiro da criação oprimida. Suspiro: gemido sem palavras que espera ouvir a música divina, a música que, se ouvida, nos traz alegria. Orações e poemas são a mesma coisa: palavras que se pronunciam a partir do silêncio, pedindo que o silêncio nos fale. É no silêncio que existe no intervalo das palavras que se ouve a Voz d’Aquele que nos fala. As orações põem música no meu silêncio”. (Rubem Alves).